Mark estava ajoelhado em frente à antiga televisão de tubo com moldura bordô, o rosto parcialmente iluminado pelo brilho azul e colorido da tela. Seus olhos verdes e intensos refletiam a expectativa e a dúvida que fervilhavam por dentro. O silêncio da noite era quebrado apenas pelo eco dos fogos da Avenida Paulista, trazendo consigo a sensação de que algo extraordinário estava para acontecer.
Beatriz entrou na sala em pijama, sentando-se no chão com uma tigela de pipoca murcha no colo. Ela observava a animação na TV, mas logo desviou a atenção para o amigo, percebendo um nervosismo diferente nele. As sombras suaves formadas pela iluminação quente desenhavam no rosto de Mark uma expressão de tensão infantil, ao mesmo tempo séria e curiosa.
Mark levantou-se de repente, inquieto, e abriu a porta que dava para o quintal. O ar noturno era fresco, e uma brisa leve agitava as folhas secas no chão. Ele se aproximou da pequena muda, ajoelhando-se sobre a terra seca, enquanto Beatriz vinha atrás, segurando a tigela de pipoca com ambas as mãos.
"O que você tá fazendo, Mark?"
"Bia... Promete que não vai contar pra ninguém?"
"Prometo." O tom de Beatriz era curioso, quase solene.
Mark respirou fundo, colocou as mãos pequenas e sujas de terra sobre o solo endurecido, e fechou os olhos. Por alguns segundos, nada aconteceu—apenas o som distante dos fogos e o próprio coração acelerado. Então, a terra começou a vibrar suavemente sob seus dedos, e grãos se moveram como se fossem atraídos por uma força invisível.
A muda, antes murcha, ergueu lentamente suas folhas, verdinhas, despertando de um sono profundo. Em segundos, floresceu, e brotos novos começaram a despontar ao redor, como se toda a vida do quintal tivesse sido reanimada por um toque mágico.
"M-MARK?! Você é um... um feiticeiro?!"
"Não! Eu não sei o que eu sou... Mas acho que isso é um poder. De controlar a terra. Igual na história do Grande Salvador. Igual aos que fazem as plantações darem certo, lembra? O povo do governo, que nunca passa fome..."
Beatriz se ajoelhou ao lado de Mark, tocando delicadamente uma das flores recém-nascidas, o rosto iluminado de admiração e medo. A pipoca havia caído esquecida ao lado deles, substituída por uma sensação de algo muito maior.
"Só duas pessoas no mundo têm esse poder, Mark..."
"Agora são três," respondeu, a voz baixa e trêmula, como se temesse o peso da própria verdade.
O silêncio caiu entre os dois, denso e carregado de significado. Mark olhou para as próprias mãos, sentindo o calor da terra pulsando sob sua pele, como se estivesse sendo acordado para um destino inesperado. Beatriz observava em silêncio, os olhos arregalados, consciente de que aquela noite mudaria tudo.
Ao fundo, a terra parecia respirar junto deles, iluminada por uma esperança antiga e silenciosa. Era como se o mundo inteiro estivesse prendendo a respiração, esperando pelo próximo passo. A terra, afinal, tinha escolhido novamente.